O Começo da música eletrônica em Brasília.
Nesse primeiro texto sobre a chegada da música eletrônica no Brasil quero deixar algumas coisas claras. Entendo e conheço a história do DJ no país, e esse não é o aspecto que quero levantar aqui, mas sim a chegada dos estilos de Detroit e Chicago no Brasil, e em Brasília. Sei que no Rio de Janeiro, em São Paulo e mesmo em Brasília existiram casas noturnas e Djs que fizeram toda a trajetória musical do período da Disco, no final dos anos 70 até o início dos 80, mas aqui focarei no legado da música eletrônica em Brasília.
São Paulo sempre foi uma cidade muito antenada com a música vinda de outros lugares do mundo e sempre teve uma vida noturna vibrante, aspectos fundamentais para a consolidação da cena eletrônica. São Paulo também viveu a transição musical da Disco para o New Wave, para o EBM, Pós Punk, etc. Seus DJs tocavam muitas coisas que eram tocadas nas pistas do mundo todo. No ano de 1983 aparece o primeiro DJ Brasileiro que virou referência para toda uma geração, seu nome é Marquinhos MS. MS, eram as iniciais de Madame Satã, casa noturna de São Paulo onde ele foi residente, junto com o Magal, e formou além de público, inúmeros DJs.
Escute acima um set do DJ Marquinhos MS de 1993
Os DJs Mau Mau, Renato Lopes, Marcos Morcef, Oscar Bueno e tantos outros foram frequentadores do Madame Satã.
Em 1988, enquanto acontecia o Verão do Amor na Europa, em SP, o Club Nation, que ficava em uma galeria da Rua Augusta, abre suas portas. No som Renato Lopes, que havia iniciado sua vida como DJ há 2 anos, é um dos residentes, o outro era Mauro Borges (falecido em 2018). Mauro, trabalhava na Bossa Nova, que era a loja de discos mais importante de SP, e na época, o melhor lugar para encontrar som underground na capital paulista.
Essa, sem dúvida, foi a primeira expressão Clubber de SP. Ali nasceu o movimento Clubber brasileiro. Os DJs Mauro Borges e Renato Lopes fizeram a história dessa música ter seu início oficial no Nation, considerado mais tarde como o primeiro templo da Dance Music do Brasil. O Club foi um divisor de águas de um som dark, sombrio e industrial, que predominava no Madame Satã, para um som efervescente tocado nas pistas do mundo, o ritmo do verão do amor, a Acid House. Diferente da cultura tradicional das boates dessa época, no Nation as pessoas se produziam muito e assumiam sua sexualidade. Tudo era permitido. Era tempo de festa.
Como as conexões, já vimos, sempre fizeram a diferença, chega a hora de introduzir Brasília nessa história. Algumas pessoas da cidade frequentaram o Nation, principalmente Pedro Tapajós e André Costa. Pedro, era conhecido como Pedrinho, e seus outros dois nomes artísticos eram: Sunrise 1 e The Six. Junto com André Costa, também conhecido pelos nomes de Cnun e Isn’t, são sem dúvida, pessoas fundamentais para o início da cena eletrônica em Brasília. Eles influenciaram toda a formação cultural da cidade, seja na utilização dos espaços físicos, seja na concepção artística de cenário ou nos flyers. Eles sempre foram muito inovadores nas formas de divulgação.
Nessa história, outras pessoas precisam ser mencionadas, pois foram fundamentais para a divulgação da música eletrônica na cidade. Uma delas, por ser um dos pioneiros na discotecagem de ritmos eletrônicos em Brasília, é o DJ Elyvio Blower. Ele tocava em rádio e também na boate Scherazade, no Torre Palace Hotel, em 1982. De lá, foi para a Zoom e depois para a Opus 4 em Taguatinga. Ele é, sem dúvida, um dos DJs pioneiros no Brasil a tocar música eletrônica. Ele continua na ativa, trabalhando em rádio, tocando em festas, boates e bares da cidade, em um deles tenho o prazer de dividir a cabine – no Dudu Bar.
Outra pessoa importante que influenciou Brasília na música eletrônica, e que talvez pouca gente conheça e tenha a dimensão da sua importância, é Daniel Cioffi, também conhecido como Danny. Ele era um americano que passou a juventude em Nova York e pôde vivenciar o despertar de um novo movimento. Era um “Party Monster”. Conheceu e frequentou todos os lugares importantes em NY onde sua base cultural foi construída. Ele também era amigo do pessoal do Deee-lite.
Danny era festeiro e um profundo conhecedor de música. Veio para capital do Brasil pois era de uma família que trabalhava para a Embaixada dos Estados Unidos. Aqui estudou na Escola Americana onde conheceu Pedro Tapajós, encontro este que deu novos ares para a capital do rock. O registro como aluno ainda está disponível no site da escola, na turma de 1988, que como já vimos, não é um ano qualquer, é o ano do Verão do Amor na Europa. Danny trouxe uma caixa de discos e tocou o terror por Brasília.
1988 foi um ano marcante. Novos conceitos surgiram em torno da música, e isso influenciou o mundo todo, e claro que também chegou na capital do país, com a vinda de Danny. Já em São Paulo, onde a noite era consolidada, a reverberação do Verão do Amor chegou com os DJs que eram antenados com essa nova cultura Club em explosão no mundo e foi com esse espírito transformador que o Nation abriu.
Foi Danny quem trouxe e apresentou os discos mais importantes da época para Pedro e André, e principalmente, foi ele quem mostrou LFO para os dois. Frequencies, do LFO, foi certamente um álbum que mudou a história da cidade. Na faixa de abertura, chamada “Intro”, o grupo que lançava pela gravadora Warp, apresenta suas influências. A música diz assim:
“House
What is house?
Technotronic, KLF, or something you just live in?
To me, house is Phuture, Pierre, Fingers, Adonis, et cetera
The pioneers of the hypnotic groove
Brian Eno, Tangerine Dream, Kraftwerk, Depeche Mode, and the Yellow Magic Orchestra
This album is dedicated to you
House
In the future
We hope our music will bring everyone a little closer together
Gay, straight, black or white
One nation under a groove”
De 1988 até 1990 Brasília tinha pouco espaço para festas eletrônicas. Das boates que existiam na época, algumas abriram as portas para os DJs e os novos ritmos. Zoom, Something, Entrecôte nas quintas feiras e principalmente, a Scaramouche no Gilberto Salomão e a New Aquarius no Conic foram boates onde Danny Cioffy se apresentou como DJ e foi, com suas músicas, o catalizador do momento. Nesses lugares a cidade teve suas primeiras experiências com esse novo ritmo em ascensão, vindo dos Estados Unidos e da Europa. E Danny, como era alguém que tinha uma ligação forte com a cena de NY, acabou trazendo toda uma cultura pulsante, e, claro, muitos discos. Para André Costa, Danny foi o nosso pioneiro absoluto.
1991/1992 foram os anos que a cidade começou a experimentar novos espaços para as festas, saindo um pouco dos espaços tradicionais das boates. O início da década de 90 trouxe duas festas marcantes em dois espaços diferentes. A primeira foi a We are Back que aconteceu na Oficina Perdiz (talvez a minha primeira festa eletrônica na cidade como frequentador) e a segunda festa foi a Mentok 1, no hangar de Ultraleves, ao lado do autódromo, ponto central da cidade. Ambas produzidas por Marcelo Galo (El Galo) e André Costa. We are Back e Mentok 1 eram nomes de faixas do primeiro disco do LFO, já mencionado antes, o Frequencies.
Todos pensam que primeira rave do Brasil foi realizada em São Paulo, a L&M Music com a presença de Moby e Altern 8 em maio de 1993.
Em Brasília, vivenciamos meses antes dessa rave em São Paulo, a Mentok 1, ao final 1992, essa festa foi realizada no hangar de ultra leve por Pedro e André. A festa foi uma das mais importantes na formação cultural da música eletrônica da cidade. Muitas pessoas foram fisgadas pelo ritmo depois dessa festa.
Em 1992 um novo espaço alternativo abriu em Brasília. Era originalmente um bar, mas tinha uma pista de dança pequena, mas bem animada. Era o Bizarre, na 402 sul, de propriedade de outro dj da cidade, o JVC, João Vicente Costa. Nesse espaço muitas festas aconteceram, e a música, a cada dia, ganhava mais adeptos.
Em destaque nessa foto está o cara que em 1991 me apresentou a música eletrônica, o Marconi. Morávamos na mesma quadra e ele se destacava pelo estilo de dançar. Foi ele quem me apresentou o André e o Pedro. Marconi é um dos irmãos mais velhos da Marlize, que anos depois foi hostess do Wlöd. O Wlöd Club será tema mais para frente no blog, onde o meu encontro com André e Pedro ganha outros patamares.
Continua…
Parabéns pela iniciativa Gulherme, tô acompanhando..
Dj Magal bem novinho na foto
Muito ne? 🙂
Excelente Gui! Lembro bem dos tempos da Wlod, Micra, Festas da Arquitetura na UNB (pista de música eletrônica) e outras tantas festas de 1995 a 1999. Obrigado!
Já falamos sobre este assunto em festas recentes no Biroska.
Que bom que curtiu cara!! Essa semana espero soltar sobre o ano de 1997, sobre o wlod já tem conteúdo 🙂
Parabéns pela iniciativa!
Obrigado!!
Maravilhosa a matéria! Já quero a continuação! Muito obrigada por compartilhar o conhecimento <3
Valeu pela força Isa, muito dessa vontade de escrever isso é por eu ter voltado a encontrar gente nova com garra e talento, como vc!
Boa Gui 😉
Vou precisar muito de sua ajuda mais pra frente 😛
Massa, Gui. Valeu por registrar a cena!
Falamos tanto disso ne cara? Que eu precisava fazer isso…hehehehe
Sensacional, Gui! Tá muito legal essa série. Parabéns pelo rolê de juntar todas as infos, imagens e textos
Valeu Chicco, foram nessas coletadas de material que achei aquela sua foto no Wlod 🙂
demais!!!
E tem muito mais ainda!
Maravilha! Sempre quis que alguém escrevesse sobre esse tempo/momento que a cidade viveu. Muito bacana o relato, Gui.. e fico aqui aguardando a continuação dessa história muito massa!
E seu nome ta gravado como parte dessa história Gualberto!
Maravilhoso esse acervo histórico da nossa cena! Obrigada Oblongui por nos presentear com um conteúdo tao especial! aguardando o próximo capitulo!
Vou te falar que tem MUITO mais ainda 🙂
Mega legal Gui, achei bem bacana. Esperando as próximas. Depois conta a história sobre vc e o LS2. Em meados de 1999, vcs já eram djs e eu estava engatinhando ainda. Hahahahaha
No aguardo. Abração
hahahaha valeu meu querido Bola!! Com certeza chegaremos lá
Muito foda Gui! Valeu por compartilhar o conhecimento 🙂 🙂
Que bom que estamos tendo a oportunidade de entender tudo ne? 🙂
Espetacular Gui!!!! Parabéns!!!
Valeu meu querido! Daqui a pouco a gente entra nessa história aí!
Parabéns Oblongui! Conteúdo excelente!
Quanta história nossa cena tem pra contar! Muitas memórias boas. Resistimos.
Nessa caçada histórica achei uma foto sua numa pista provavelmente dentro de um onibus…mas essa história ta mais pra frente 😛
Muito legal, Gui! Parabéns pelo trabalho.
Lembro de alguns desses momentos, eu já acompanhava as rádios e desejava as boates desde muito novo. Ansioso pelos próximos capítulos!
Que maravilha Pezão!! Eu tb tinha um amigo que era viciado no programa MixRemixMasterMix e escutávamos direto!
Primeiro parabéns pelo blog, moro aqui no DF não sou de Brasília, sou fã desta época que a música eletrônica chegou no Brasil. Para título de curiosidade o primeiro espaço de música eletrônica que tenho notícias foi a guilden em Belo Horizonte em 1988 espaço frequentado por um grande promoter de Brasília que nesta época morava por aquelas bandas “Marcelo Galo” ele juntamente com Aleixo Torquato e André alguns anos depois foram os responsáveis de promoverem os espaços e festas de Brasília como exemplo a festa do hangar do ultraleve, New aquarius, Lapa…. Muito se esquecem dos promoters que eram fundamentais naquela época para influenciar e fazer acontecer o movimento da cena eletrônica.
Que demais!! O Marcelo Gallo já entra nesse próximo capítulo, figura importantíssima pra Brasília!
OblonguiPedia!
Que trabalho formidavel.
[…] caro e distante. Brasília conseguiu despertar para a música eletrônica graças ao encontro do Danny com o Pedro Tapajós. Hoje da para ter uma melhor compreensão do quanto esse encontro encurtou nosso processo de […]
[…] final do post anterior, que falo do início da cena eletrônica em Brasília, eu comentei sobre o Marconi, que foi quem me apresentou esse novo estilo […]